Tive a oportunidade de participar de diversas conversas, palestras e reportagens. Algumas vezes como entrevistado, outras como entrevistador. Quando era entrevistado, percebia que nem sempre o roteiro seguia fielmente o que a pauta determinava. Alguns assuntos surgiam e outros vinham à tona após determinada pergunta. No entanto, suspeito que esses entrevistadores haviam se preparado muito para a entrevista e para que ela gerasse o resultado esperado, seja em uma reportagem, ou em um evento. Larry King, o ícone norte-americano das entrevistas – que faleceu recentemente – foi extremamente criticado por diversos jornalistas – com diploma ou não – pelo fato de exercer suas perguntas aos entrevistados de forma breve e sucinta, além de deixa-los livres para pautar qualquer tema. Larry admitiu que não fazia muita pesquisa a respeito do entrevistado, e também que nunca quis ser visto como jornalista: “Meu dever é ser um condutor, não estou lá para fazer conclusão, tento apresentar alguém da melhor maneira”, declarou certa vez King. E assim fez sua brilhante carreira, batendo papo inteligente com chefes de Estado e celebridades. Levantou assuntos polêmicos, relevantes, como por exemplo em 2014 onde perguntou ao Dalai Lama o que ele pensava sobre o casamento gay. Em Paraty, participei de uma entrevista na Casa Folha FLIP 2017 para falar sobre o lançamento do livro Grandes Crimes. Enquanto a jornalista Patrícia Campos Mello me entrevistava, percebi que diversos autores do livro estavam na plateia. Não tive dúvida, franqueei a palavra a todos os autores presentes. Patrícia entendeu e riu. Experiente que é, deixou a entrevista fluir. Foi maravilhoso. Em outra ocasião, quando entrevistei o apresentador Luciano Huck na Casa do Saber, o roteiro foi completamente alterado. Na mesma manhã, Huck havia participado de uma palestra com o presidente americano Barack Obama, e transformou a minha conversa com ele em algo mais enriquecedor. Mas com um pequeno e insignificante detalhe: ele não me avisou. Ingenuidade minha achar que iria conduzir a conversa com um dos maiores entrevistadores do Brasil. Mesmo sendo inexperiente, deixei o papo rolar. Deixar se levar pelo roteiro pré-determinado pode tornar a entrevista engessada demais, e, por outro lado, devemos sempre seguir uma linha de raciocínio para transmitir a mensagem correta. Márcio Thomaz Bastos, advogado e ministro da justiça no governo Lula, certa vez me agradeceu por ter levado a entrevista que fiz com ele na Casa do Saber de forma leve, que posteriormente se transformou em um dos temas do livro Grandes Advogados. Naquela ocasião, Bastos teve a oportunidade de descrever sua infância e sua história de forma espontânea, pautada em sua trajetória jurídica. Me relatou ter sido alvo de questões duras e perguntas difíceis por parte de entrevistadores do CPDOC da Fundação Getúlio Vargas que tentavam, de certa forma e cumprindo seus papeis, encontrar paradoxos de sua trajetória através de suas respostas. Assim como Larry King, eu na Casa do Saber não era um jornalista e sim um mediador. Portanto, mediar uma conversa, permitir a linha de raciocínio do entrevistado e não determinar as escalas dos limites da fala e do contexto eram primordiais. O humorista Jô Soares também relatou o porquê de ser tão duro com alguns entrevistados. Ele afirmou que se preparava meticulosamente àquilo, escolhia a dedo o tema daquela entrevista e qual mensagem gostaria de passar para o telespectador, portanto quando algum entrevistado saía da pauta que havia sido combinada previamente, era como se o propósito daquela conversa tivesse se perdido. Isso pode ser aplicado no ambiente acadêmico e em outros lugares, quando temos um take-home value, combinado previamente com quem nos fez o convite. Então eu recomendo que você entrevistado ou entrevistador, prepare-se: vai acontecer tudo diferentemente do que você planejou. Mas se você estiver preparado tudo vai dar certo. Para quem quiser se aprofundar mais no assunto: https://www.youtube.com/watch?v=pjvvvsr8e2m http://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/campo_juridico/marcio_thomaz_bastos/transcricaomarciothomazbastos_entrevista2.pdf https://www.youtube.com/watch?v=da1mloxrslu https://www.amazon.com.br/grandes-crimes-pierre-moreau/dp/8568493394 https://www.amazon.com.br/grandes-advogados-pierre-moreau/dp/8577341666 COORDENAÇÃO https://migalhas.uol.com.br/res/img/coluna/colunista/PierreMoreau.jpg Pierre Moreau é sócio-fundador da Moreau | Valverde Advogados (1991) e da Casa do Saber (2004), ex conselheiro fiscal do Hospital Sírio Libanês, árbitro de diversas câmaras de arbitragem. Professor do Insper e professor visitante na Universitat St. Gallen, organizou e escreveu diversos livros como Fora da Curva II (Portfolio-Penguin, 2020), A Nova Geração de CEOs (Portfolio-Penguin, 2018), Grandes Crimes (Três Estrelas, 2017), Fora da Curva (Portfolio-Penguin, 2016), Grandes Advogados (Casa da Palavra, 2011 e O Financiamento da Seguridade Social na União Europeia e no Brasil (Quartier Latin, 2005). É mestre e doutor em Direito pela PUC/SP. Cursou Harvard Law School e Harvard Business School.