Indenização é concedida pelo Judiciário a pessoas que usam as plataformas para trabalho Por Gilmara Santos – De São Paulo 08/11/2021 05h01 Atualizado há uma hora.
Usuários que adotaram redes sociais como ferramentas de trabalho têm recorrido à Justiça para restabelecer contas invadidas por hackers ou desativadas. As decisões garantem, além do direito de voltarem às plataformas, indenização por danos morais. Os valores variam entre R$ 3 mil e R$ 10 mil. O caminho da Justiça foi seguido, nesses casos, depois de tentarem todos os passos administrativos sugeridos pelas plataformas. Com a pandemia da covid-19, redes sociais como Instagram e Facebook se tornaram importantes ferramentas para divulgação e venda de produtos e serviços. “É realmente desgastante para o usuário. Há situações graves. Muitas vezes a rede social é a única forma de sustento da família”, diz a advogada Adriana Rollo, do escritório Bronstein Zilberberg Chueiri e Potenza. Ela acrescenta que tem notado um aumento no número de casos de indenização para usuários que tiveram contas em redes sociais invadidas. Uma usuária do Instagram só conseguiu recuperar sua conta, com cerca de 8 mil seguidores, 140 dias após ela ser invadida por hackers e desativada. Tentou as vias administrativa e extrajudicial – como o Procon -, mas só obteve de volta o acesso por meio de liminar (processo nº 1003202-96.2021.8.26.0562). Na sentença, proferida posteriormente, o juiz Fernando de Oliveira Mello, da 12ª Vara Cível de Santos (SP), garantiu ainda danos morais no valor de R$ 5 mil, a ser pago pelo Facebook, dono da marca Instagram. Ele levou em consideração a importância da conta para a usuária e destacou que “uma infinidade de pessoas acabam por depender da plataforma virtual para obter renda, muitas vezes essencial à sua própria manutenção”. “O fato de a autora ter sido impedida de utilizar sua conta por cerca de 140 dias, considerando-se que a plataforma em questão é meio de divulgação de seu trabalho, não pode ser considerado mero aborrecimento, desconforto, dissabor ou incômodo momentâneo, mas sim aviltamento exacerbado, capaz de causar relevante dano à integridade psicológica e, portanto, aos direitos de personalidade da consumidora”, diz o magistrado na sentença. Na decisão, o juiz cita precedentes de duas Câmaras de Direito Privado (1ª e 28ª) do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). Um dos casos envolve um ator nacionalmente conhecido. Ele alegou que o bloqueio de sua conta no Instagram por três dias, após ter sido invadida, trouxe prejuízos à sua imagem e divulgação de seus trabalhos. Obteve dos desembargadores a confirmação de indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil (apelação nº 1008681-94.2020.8.26.0048). Nesses casos, segundo a advogada Mariana Valverde, do escritório Moreau Valverde Advogados, primeira e segunda instâncias têm aplicado o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e garantido a inversão do ônus da prova, em razão da hipossuficiência técnica dos usuários. “Trata-se de uma prestação de serviços, já que o cliente faz um contrato de adesão com aquela rede social”, diz. Nos processos, os provedores alegam que não podem ser responsabilizados por eventual invasão ou subtração de dados por terceiros e que cabe ao usuário zelar pela proteção de dados de acesso à conta. Mesmo com essa argumentação, têm sido condenados. Recentemente, a 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal entendeu que houve falha na prestação do serviço prestado a uma usuária. A sua conta no Instagram foi invadida por terceiros, que alteraram a foto do perfil, apagaram as postagens e impediram o seu acesso. Após entrar em contato com a plataforma, a conta foi excluída. Foi criada no ano de 2015 e é utilizada como vitrine dos produtos que comercializa – mobiliários infantis. A conta possui mais de 42 mil seguidores (processo nº 0731175-53.2020.8.07.0016). Os julgadores mantiveram a sentença proferida pela juíza Marília de Ávila e Silva Sampaio, do 6º Juizado Especial Cível de Brasília, que condenou o Facebook a pagar R$ 3 mil de danos morais. “O sofrimento e angústia decorrente da usurpação de sua conta na rede social por terceiros, prejudicando seu meio de sustento e divulgação publicitária de sua empresa, é evidente, sendo passível de violação dos direitos da personalidade, revelando-se suficientes para imputar à requerida o dever de indenizar o dano moral causado”, diz a magistrada na decisão. O advogado Luiz Prado, do escritório Prado Vidigal, alerta que os usuários que vendem produtos e serviços pelas redes sociais devem ter cuidado extra com segurança. Precisam de senha forte, verificação em duas etapas e e-mail para recuperação da conta atualizado. “O Judiciário tem reconhecido indenização, mas depende de cada caso. A responsabilidade objetiva da rede social não é absoluta”, afirma. “Ainda que fique comprovado que houve responsabilidade da plataforma, a indenização só vai ser efetivada com comprovação do dano”, complementa o advogado. A advogada Mariana Valverde vai além e diz que é importante que o usuário não fique tentando achar atalhos milagrosos para recuperar a conta. “Há pessoas que dizem que conseguem recuperar o perfil de forma fácil, mas isso só fomenta a indústria de hackers”, afirma. Procurado pelo Valor, o Facebook, dono do Instagram e do WhatsApp, reforçou, por meio da sua assessoria de imprensa, as dicas de segurança – como manter uma senha forte e a autenticação em duas etapas – e os caminhos administrativos para recuperar as contas. Porém, não quis comentar os processos judiciais.